Memórias da violência no drama pós-catástrofe / Memories of Violence in Post-Catastrophe Drama

Rainério dos Santos Lima

Resumo


Resumo: A partir, principalmente, de Walter Benjamin e Jean-Pierre Sarrazac, esse trabalho analisa a insurgência na dramaturgia de Plínio Marcos de um embrião narrativo que, fazendo uso da memória traumática dos personagens e da crítica do poder como violência (Gewallt), encontrará sua realização plena em Querô, uma reportagem maldita, romance e drama da década de 1970. Na adaptação teatral do romance, a forma biográfica da matéria rememorada, princípio constitutivo da ação dramática, impôs mudanças na fábula que, negando a estrutura sintagmática da ação, passou a assumir uma configuração pós-catástrofe da cena, na qual o passado de violências do personagem é agenciado no presente da enunciação por uma “dramaturgia do retorno” e por um processo descontínuo e disjuntivo das lembranças. Na comparação entre drama e romance, compreende-se como a memória da educação sentimental de Querô coloniza a ação teatral, caracterizando uma dramaturgia da intrassubjetividade em que o personagem, testemunha de si mesmo, narra a própria Paixão.

Palavras-chave: crítica da violência; drama pós-catástrofe; Plínio Marcos.

Abstract: Grounded mainly on Walter Benjamin and Jean-Pierre Sarrazac’s work, this article analyzes the insurgency in Plinio Marcos’s dramaturgy of a narrative embryo that, using the traumatic memory of characters and the critique of power as violence (Gewallt), will find its full materialization in Querô, a Damned Report (“Querô, Uma reportagem maldita”), romance and drama on the 1970s. In the theatrical adaptation of the novel, the biographical form of the remembered matter, constitutive principle of dramatic action, imposed changes in the fable that, denying the syntagmatic structure of the action, began to assume a post-catastrophe configuration of the scene in which the violent past of the character is settled in the present of the enunciation by a “dramaturgy of return” and by a discontinuous and disjunctive process of remembering. Comparing the drama and the novel, one understands how the memory of Querô’s sentimental education colonizes the theatrical action, characterizing a dramaturgy of intra-subjectivity in which the character, witness of himself, narrates his own Passion.

Keywords: criticism of violence; post-catastrophe drama; Plinio Marcos.


Palavras-chave


crítica da violência; drama pós-catástrofe; Plínio Marcos; criticism of violence; post-catastrophe drama.

Texto completo:

PDF

Referências


AVELAR, I. Espectros de Walter Benjamin: luto e violência em Jacques Derrida. In: ______. Figuras da violência: ensaios sobre narrativa, ética e música popular. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. p. 71-103.

BENJAMIN, W. A crise do romance: sobre Berlin Alexanderplatz de Döblin. In: ______. Magia e técnica, arte e política – obras escolhidas I. 8. ed. Trad. Sergio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 2012. p. 55-61.

BENJAMIN, W. O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: ______. Magia e técnica, arte e política – obras escolhidas I. 8. ed. Trad. Sergio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 2012. p. 213-240.

BENJAMIN, W. Sobre a crítica do poder como violência. In: ______. O anjo da história. Trad. João Barrento. Belo Horizonte: Autêntica, 2012. p. 57-82.

BUTLER, J. Tortura e ética da fotografia: pensando com Sontag. In: ______. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto?. 2. ed. Trad. Sérgio Lamarão e Arnaldo Marques da Cunha. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. p. 99-149.

CONTRERAS, J. A.; MAIA, F.; PINHEIRO, V. Plínio Marcos: a crônica dos que não têm voz. São Paulo: Boitempo, 2002.

FOUCAULT, M. História da sexualidade I: A vontade de saber. Trad. Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.

FOUCAULT, M. Sobre a prisão. In: ______. Microfísica do poder. 2. ed. Trad. Roberto Machado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015. p. 213-233.

GAGNEGIN, J. O rastro e a cicatriz: metáforas da memória. In: ______. Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo: Ed. 34, 2006. p. 107-118.

GAGNEGIN, J. Walter Benjamin: os cacos da história. Trad. Sônia Salzstein. São Paulo: n-1 Edições, 2018.

KUNTZ, H.; NAUGRETTE, C.; RIVIERE, J. Catástrofe. In: SARRAZAC, J.-P. (org.). Léxico do drama moderno e contemporâneo. São Paulo: Cosac & Naify, 2012. p. 45-47.

LÖWY, M. Walter Benjamin: aviso de incêndio. Uma leitura das teses “Sobre o conceito de História”. Trad. Wanda Nogueira Caldeira Brant. São Paulo: Boitempo, 2005.

LUKÁCS, G. A teoria do romance: um ensaio histórico-filosófico sobre as formas da grande épica. Trad. José Marcos Mariani de Macedo. São Paulo: Duas Cidades; Ed. 34, 2000.

LUNA, S. A tragédia no teatro do tempo: das origens clássicas ao drama moderno. João Pessoa: Ideia, 2008.

MAAS, W. P. M. D. O cânone mínimo: o Bildunsroman na história da literatura. São Paulo: EDUNESP, 2000.

MARCOS, P. O assassinato do anão do caralho grande: noveleta e peça teatral. São Paulo: Geração Editorial, 1996.

MARCOS, P. Oração para um pé de chinelo. São Paulo: Global, 1979.

MARCOS, P. Plínio Marcos: melhor teatro. São Paulo: Global, 2003.

MARCOS, P. Uma reportagem maldita (Querô). 8. ed. São Paulo: Parma, 1984.

MARTINS, L. M. A cena em sombras. São Paulo: Perspectiva,1995.

RANCIÈRE, J. O espectador emancipado. Trad. Ivone C. Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2017.

SARRAZAC, J.-P. Poética do drama moderno: de Ibsen a Koltès. Trad. Newton Cunha, J. Guinsburg, Sônia Azevedo. São Paulo: Perspectiva, 2017.

SARRAZAC, J.-P. Sobre a fábula e o desvio. Trad. Fátima Saad. Rio de Janeiro: 7 Letras: Teatro do Pequeno Gesto, 2013.

SZONDI, P. Teoria do drama moderno (1880-1950). Trad. Luiz Sérgio Rapa. São Paulo: Cosac & Naify, 2001.

WILLIAMS, R. Tragédia moderna. Trad. Betina Bischof. São Paulo: Cosac & Naify, 2002.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2179-8478.15.2.27-48

Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Cadernos Benjaminianos
ISSN 2179-8478 (eletrônica)

Licença Creative Commons
Licenciada sob uma licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.