Tempo revisto, tempo reescrito: as metaficções historiográficas / Revised Time, Rewritten Time: Historiographic Metafictions

Anne Greice Soares La Regina

Resumo


Resumo: O presente artigo, trabalho de pesquisa bibliográfica com viés qualitativo, empreende um recorte histórico das discussões em torno da metaficção historiográfica e da metabiografia num período que compreende o final do século XX. Esta investigação busca demonstrar o modo pelo qual estas narrativas se configuraram como respostas da arte e da cultura a fenômenos complexos, determinados pela crise do regime modernista de historicidade que encontrou ressonância também nas concepções pós-modernistas que, por sua vez, retomaram as discussões acerca das contradições do próprio modernismo e recuperaram o debate acerca da dicotomia entre altas artes e cultura de massa. A conjuntura pós-modernista se afigura ainda hoje também como espaço no qual se instauram debates sobre questões que emergem de uma sociedade fortemente marcada pelo capitalismo global e pelas tecnologias da comunicação que, produzindo uma sobrecarga de informações, gera a necessidade premente de frear este desgaste do tempo, organizar e apreender o passado, de onde surgem os discursos sobre a memória e todas as interpretações do tempo. Este apelo à releitura acaba por produzir uma poética da [re]criação que se alimenta dos resíduos culturais do passado. Como lastros teóricos das análises propostas sobre a metaficção, privilegia-se, sobretudo, o pensamento de Linda Hutcheon sobre as poéticas pós-modernistas em conjunção com o conceito de historiofagia de Walter Moser, bem como com as transformações no pensamento historiográfico promovido por Les Annales e desenvolvido pelo micro-história.

Palavras-chave: metaficção historiográfica; metabiografia; poéticas pós-modernistas; Les Annales; micro-história.

Abstract: This article is a bibliographic research with a qualitative bias on historiographical metafiction and metabiography in the last two decades of the 20th century, aiming to explain how these narratives arose as responses of art and culture to complex phenomena, determined by a crisis of the modernist regime of historicity that meets resonance also in the postmodernist conceptions that resume discussions about the contradictions of modernism itself and recover the debate about the dichotomy between high arts and mass culture. The postmodernist conjuncture also appears as a space in which debates on issues that emerge from a society strongly marked by global capitalism and communication technologies are established and, producing an information overload, generate the need to organize and apprehend the past, from where the speeches about memory and all interpretations of time arise. This appeal to re-reading ends up producing a poetics of [re]creation that feeds on the cultural residues of the past. As theoretical backbones of the proposed analyses of metafiction, Linda Hutcheon’s work about postmodernist poetics in conjunction with Walter Moser’s concept of historiography is privileged, as well as with the transformations in the historiographic thought promoted by Les Annales and developed by microhistory.

Keywords: historiographical metafiction; metabiography; postmodernist poetics; Les Annales; microhistory.


Palavras-chave


metaficção historiográfica; metabiografia; poéticas pós-modernistas; Les Annales; micro-história; historiographical metafiction; metabiography; postmodernist poetics; Les Annales; microhistory.

Texto completo:

PDF

Referências


BARTHES, R. Prefazione dell’autore. In: ______. Sade, Fourier, Loyola. Traduzione di L. Lonzi e R. Guidieri. Torino: Einaudi, 2001. p. XXI-XXX.

BENJAMIN, W. Sobre o conceito de história. In: ______. Magia e técnica, arte e política: ensaio sobre literatura e história da cultura. 7. ed. Tradução de S. Rouanet e J. Gagnebin. São Paulo: Brasiliense, 1994. p. 222-232.

BERNARDELLI, A. Intertestualità. Milano: La Nuova Italia, 2000.

BURKE, P. (org). A escrita da história: novas perspectivas. Tradução de M. Lopes. São Paulo: Editora UNESP, 2011.

BURKE, P. História e teoria social. Tradução de K. B. Gerhardt e R.V. Majer. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

DOSSE, F. A história em migalhas: dos Annales à nova história. Tradução de D. O. A. dos Santos. Bauru, SP: EDUSC, 2003.

ECO, U. Postille a il nome della Rosa. Milano: Bompiani, 1983.

ECO, U.; SEBEOK, T. (org.). Il segno dei tre: Holmes, Dupin, Peirce. Milano: Bompiani, 1983.

GINZBURG, C. O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição. Tradução de M. B. Amoroso. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

GOMES, R. C. O histórico e o urbano – sob o signo do estorvo duas vertentes na narrativa brasileira contemporânea. Revista Brasileira de Literatura Comparada, Porto Alegre, v. 3, n. 3, p. 121-120, 1996.

GONÇALVES, J. R. S. O mal-estar no patrimônio: identidade, tempo e destruição. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 28, n. 55, p. 211-228, jan./jun. 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-21862015000100012. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/eh/v28n55/0103-2186-eh-28-55-0211.pdf. Acesso em: 12 fev. 2021.

HARTOG, F. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Tradução de A. S. de Menezes et al. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.

HUTCHEON, L. Poética do pós-modernismo: história, teoria e ficção. Tradução de R. Cruz. Rio de Janeiro: Imago, 1991.

IOVINELLI, A. L’autore e il personaggio: l’opera metabiografica nella narrativa italiana degli ultimi trent’anni. Milano: Rubbettino, 2004.

JAMESON, F. A virada cultural: reflexões sobre o pós-moderno. Tradução de C. Araújo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.

JAMESON, F. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. Tradução de M. E. Cevasco. São Paulo: Ática, 1997.

KRISTEVA, J. La parola, il dialogo e il romanzo. In: IVANOV, V. V. et al. Michail Bachtin: semiotica, teoria dela letteratura e marxismo. Traduzione di A. Ponzio et al. Bari: Dedalo, 1977. p. 105-138.

MACEDO, A. G. S. R. Máquina de [re]escrever: processos de reciclagem cultural da obra metabiográfica de Ana Miranda. 2010. 245f. Tese (Doutorado em Letras) – Instituto de Letras, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2010. Disponível em: http://www.repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/8559. Acesso em: 12 fev. 2021.

MIRANDA, A. Boca do Inferno. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

MORANDINI, M.; MORANDINI, L.; MORANDINI, L. Il Morandini 2008: Dizionario dei film. Bologna: Zanichelli, 2008.

MOSER, W. O estudo do não-contemporâneo: historiofagia ou historiografia. Tradução de V. Morello e A. Ciulla. Cadernos do Centro de Pesquisas Literárias PUCRS, Porto Alegre, v. 1, n. 2, p. 1-11, 1995.

POE, E. A. A filosofia da composição. Tradução de L. V. de Castro. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2008.

SANTIAGO, S. Democratização no Brasil. In: ANTELO, R.; CAMARGO, M. L. B.; ALMEIDA, T. V. de (org.). Declínio da arte, ascensão da cultura. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 1998. p. 11-24.

SANTIAGO, S. Em liberdade: uma ficção de Silviano Santiago. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2238-3824.26.1.129-144

Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Direitos autorais 2021 Anne Greice Soares La Regina

Licença Creative Commons
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.