Vozes em (des)concerto: monólogo dramático e endereçamento lírico em “Os dias de então”, de Claudia Roquette-Pinto Voices in (Dis)arrangement: Dramatic Monologue and Lyric Address in “Os Dias de Então” by Claudia Roquette-Pinto

Luciana Henrique Mariano da Silva

Resumo


Resumo: O artigo analisa o poema “Os dias de então”, de Claudia Roquette-Pinto (Margem de manobra, 2005, p. 85-86), a partir da estrutura do gênero monólogo dramático, fundamentado segundo Jane Roche-Jaques (2020) e Shira Wolosky (2001). São considerados também os processos de ficcionalização da voz poética (COMBE, 2009/2010) e de endereçamento lírico (CULLER, 2015; SERMET, 2019), para compreender os efeitos da orquestração das vozes presentes no poema. Em “Os dias de então”, há uma voz principal em primeira pessoa, identificada pela autora como Zelda Fitzgerald. A fala de Zelda foi traduzida e adaptada por Roquette-Pinto a partir de um excerto de carta a Scott Fitzgerald. A languidez e delicadeza dessa voz subjetiva em prosa é entrecortada por outras vozes em verso, impessoais, anônimas e de conteúdo violento. O leitor testemunha conexões subterrâneas entre a voz principal e as demais enunciações por meio da brutalidade e do choque, no concerto da cena maior do poema. Tais conexões e referências são rarefeitas e instáveis, recurso frequente na poesia de Claudia Roquette-Pinto. Para compreender o concerto dessas articulações enunciativas e o construto social que as põe em movimento, são levantadas informações biográficas (MILFORD, 2013; BRYER et al, 2002) e confluências entre o gênero carta (SILVA, 2002) e o gênero lírico (ADORNO, 2003). 

 

Palavras-chave: monólogo dramático; endereçamento lírico; poesia contemporânea; voz; Claudia Roquette-Pinto.

 

Abstract: The paper analyses the poem “Os dias de então”, by Claudia Roquette-Pinto (Margem de manobra, 2005, p. 85-86) from the point of view of dramatic monologue genre, based on Jane Roche-Jaques (2020) and Shira Wolosky (2001). Voice fictionalization processes (COMBE, 2009/2010), just as lyric addressment (CULLER, 2015; SERMET, 2019) are also considered in order to understand the effects of the orchestrated voices in the poem. There is a leading voice in “Os dias de então”, identified as Zelda Fitzgerald’s by the author. Zelda’s speech was translated and adapted by Roquette-Pinto from a part of a letter to Scott Fitzgerald. The languor and tenderness of this subjective voice in prose is crossed by other voices in verse which are impersonal, anonymous and bring up violent content. The reader testifies subterranean links between the leading voice and the other utterances through brutality and impact, in the poem’s bigger arrangement. Such links and references are rarefied and unstable, which is often noted in Claudia Roquette-Pinto’s poetry. Biographic information (MILFORD, 2013; BRYER et al, 2002) and confluences between lettering and lyric genres (SILVA, 2002; ADORNO, 2003) are brought up in the article in order to understand the arrangement of utterance articulation, as well as the social construct that moved them.

 

Keywords: dramatic monologue; lyric addressment; contemporary poetry; voice; Claudia Roquette-Pinto.


Palavras-chave


monólogo dramático; endereçamento lírico; poesia contemporânea; voz; Claudia Roquette-Pinto, dramatic monologue; lyric addressment; contemporary poetry; voice; Claudia Roquette-Pinto.

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DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2358-9787.31.1.268-287

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