A violência verbal em manifestações explícitas de preconceito linguístico no Facebook: um espaço discursivo êmico / Verbal violence in explicit expressions of linguistic prejudice on Facebook: an emic discursive space

Anderson Ferreira, Samine de Almeida Benfica

Abstract


Resumo: Este artigo examina a violência verbal em comentários produzidos na mídia social Facebook, na página “Falei errado? O pobrema não é meu, é seu”, após uma publicação com a legenda “Não é engraçado, #ÉPreconceitoLinguístico”. É o objetivo verificar os papéis e lugares discursivos, os estatutos sócio-psicológicos estereotipados e os posicionamentos político-ideológicos presentes nas práticas discursivas dos sujeitos-usuários, considerando que a controvérsia é impulsionada por uma constatação científica – em particular, da Sociolinguística – segundo a qual a reprovação, a repulsa ou o desrespeito às variedades linguísticas de menor prestígio social se configuram como preconceito e intolerância linguísticos. Para tanto, a fundamentação se deu em um quadro teórico-metodológico interdisciplinar que abrange os estudos das origens do português brasileiro (BAXTER; LUCCHESI, 1997; NARO; SCHERRE, 2003), a noção de polêmica discursiva (AMOSSY, 2011), as noções de interincompreensão e espaço discursivo (MAINGUENEAU, 1997, 2008, 2015) e, por fim, a categoria de espaço êmico (BAUMAN, 2001). As análises revelam que muitos discursos refletem um anseio de aniquilamento e de apagamento de identidades sociais e que, mesmo em contextos de discussão sobre preconceito linguístico, a violência verbal não se centra somente nessa temática, mas abrange tudo aquilo que, de certa forma, representa as minorias sociais.

Palavras-chave: violência verbal; preconceito linguístico; espaço discursivo êmico; Facebook.

Abstract: This article examines verbal violence in comments produced on the social media Facebook, on the page “Falei errado? O pobrema não é meu, é seu” (Did I say it wrong? The problem is not mine, it’s yours), after a publication with the subtitles “Não é engraçado, #ÉPreconceitoLinguístico” (It’s not funny, #ItsLinguisticPrejudice). The objective is to verify the discursive roles and places, the stereotyped socio-psychological statutes and the political-ideological positions that are in the discursive practices of the subject-users, considering that the controversy is driven by a scientific observation – in particular, of Sociolinguistics – according to which disapproval, disgust or disrespect for less prestige linguistic varieties are configured as linguistic prejudice and intolerance. To this end, the foundation was given in an interdisciplinary theoretical-methodological framework that encompasses studies on the origins of Brazilian Portuguese (BAXTER; LUCCHESI, 1997; NARO; SCHERRE, 2003), the notion of discursive polemics (AMOSSY, 2011), the notions of inter-understanding and discursive space (MAINGUENEAU, 1997, 2008, 2015) and, finally, the category of emic space (BAUMAN, 2001). The analyzes reveal that many speeches reflect a desire to annihilate and erase social identities and that, even in contexts of discussion on linguistic prejudice, verbal violence does not focus only on this theme, but encompasses everything that, in a certain way, represents social minorities.

Keywords: verbal violence; linguistic prejudice; emic discursive space; Facebook.


Keywords


violência verbal; preconceito linguístico; espaço discursivo êmico; Facebook; verbal violence; linguistic prejudice; emic discursive space.

References


AMOSSY, R. La coexistence dans le dissensus. Semen, Besançon, n. 31, p. 25-42, 2011. Disponível em: https://journals.openedition.org/semen/9051. Acesso em: 30 jan. 2020.

BAGNO, M. A língua de Eulália: novela sociolinguística. São Paulo: Contexto, 1997.

BAGNO, M. O que é um “erro” em português? In: ______. Blog Marcos Bagno. 13 ago. 2013. Disponível em: https://marcosbagno.wordpress.com/2013/08/13/o-que-e-um-erro-de-portugues/. Acesso em: 31 jan. 2020.

BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 15. ed. Loyola: São Paulo, 2015.

BAGNO, M. A colonização pronominal. In: SCHETTINO, R. Blog Brasiliários.com. 12 set. 2017a. Disponível em: https://www.brasiliarios.com/colunas/66-marcos-bagno/689-a-colonizacao-pronominal. Acesso em: 22 jan. 2020.

BAGNO, M. Português brasileiro (outra vez). In: Blog da Parábola Editorial. 31 ago. 2017b. Disponível em: https://www.parabolablog.com.br/index.php/blogs/portugues-brasileiro-outra-vez. Acesso em: 22 jan. 2020.

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1995.

BALOCCO, A. E.; SHEPHERD, T. M. G. A violência verbal em comentários eletrônicos: um estudo discursivo-interacional. D.E.L.T.A., São Paulo, v. 33, n. 4, p. 1013-1037, 2017.

BAUMAN, Z. A modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

BAXTER, A. N.; LUCCHESI, D. A relevância dos processos de pidginização e crioulização na formação da língua portuguesa no Brasil. Estudos Linguísticos e Literários, Salvador, n. 19, p. 65-83, 1997.

BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. Tradução de Carmen C. Varriale et al. Coord. trad. João Ferreira. Ver. geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cacasi. 13. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 2009.

BOUSFIELD, D. Impoliteness in Interaction. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins, 2008.

CANO, M. R. O.; CELESTINO, R. Lugares interincompreensivos e ambivalentes em anúncios publicitários que topicalizam a sexualidade. In: NASCIMENTO, J. V.; FERREIRA, A. (org.). Discurso e cultura: v. 2. São Paulo: Blucher, 2019. p. 188-212.

CULPEPER, J. Impoliteness: Using Language to Cause Offence. Cambridge/Nova Iorque: Cambridge University Press, 1993.

DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. Tradução de Mariana Echalar. São Paulo: Boitempo, 2016.

DEBRAY, R. Curso de midiologia geral. Tradução de João de Freitas Teixeira. Petrópolis: Vozes, 1993.

FARACO, C. A. História sociopolítica da língua portuguesa. São Paulo: Parábola Editorial, 2016.

FERREIRA, A.; CHAVES, R. S. A responsabilidade enunciativa no discurso escolar. Caminhos em Linguística Aplicada, Taubaté, v. 18, p. 161-184, 2018.

FERREIRA, A.; FERREIRA, C. S.; CHAVES, R. S. As práticas discursivas da violência nas mídias digitais: Marielle Franco, presente... no espaço discursivo êmico. (Con)Textos Linguísticos, Vitória, v. 2, p. 59-78, 2018.

FOUCAULT, M. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987.

GARAND, D. Propostas metodológicas para o estudo da controvérsia. In: HAYWARD, A.; GARAND, D. Estudos de controvérsia. Montreal: Nota Bene, 1998. p. 211-268.

HERRING, S. C. Gender and Democracy in Computer-Mediated Communication. Electronic Journal of Communication, [S.l.], v. 3, n. 2, p. 1-17, 1993.

LEITE, M. Q. Preconceito e intolerância na linguagem. São Paulo: Contexto, 2008.

LÉVI-STRAUSS, C. Tristes Trópicos. Tradução de Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

LIBÂNEO, J. C. Democratização da escola pública: a pedagogia crítico-social dos conteúdos. 20. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2005.

LUCCHESI, D.; BAXTER, A.; RIBEIRO, I. (org.). O português afro-brasileiro. Salvador: EDUFBA, 2009.

MAINGUENEAU, D. Novas tendências em Análise do Discurso. 3. ed. Tradução de Freda Indursky. Campinas: Pontes Editores, 1997.

MAINGUENEAU, D. Discurso literário. Tradução de Adail Sobral. São Paulo: Contexto, 2006.

MAINGUENEAU, D. Gênese dos discursos. Tradução de Sírio Possenti. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.

MAINGUENEAU, D. Análise de textos de comunicação. 6. ed. ampl. Tradução de Cecília P. de Souza e Délcio Rocha. São Paulo: Cortez, 2013.

MAINGUENEAU, D. Discurso e análise do discurso. Tradução de Sírio Possenti. São Paulo: Parábola Editorial, 2015.

MAINGUENEAU, D. Retorno crítico sobre o ethos. In: BARONAS, R. L.; MESTI, P. C.; CARREON, R. O. (org.). Análise do Discurso: entorno da problemática do ethos, do político e de discursos constituintes. Campinas: Pontes Editores, 2016. p. 13-33.

MATTOS E SILVA, R. V. Variação, mudança e norma: movimentos no interior do português brasileiro. In: CARDOSO, S. A. M. (org.). Diversidade linguística e ensino. Salvador: EDUFABA, 1996. p. 19-43.

NARO, A. J.; SCHERRE, M. M. P. O conceito de transmissão linguística irregular e as origens estruturais do português brasileiro: um tema em debate. In: RONCARATI, C.; ABRAÇADO, J. (org.). Português brasileiro: contato linguístico, heterogeneidade e história. Rio de Janeiro: 7Letras, 2003. p. 285-302.

NARO, A. J.; SCHERRE, M. M. P. Origens do português brasileiro. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.

PERICÁS, L. B. Caio Prado Júnior: uma biografia política. São Paulo: Boitempo, 2016.

SCHERRE, M. M. P. Respeito linguístico. In: ARNT, R. M.; SCHERRE, P. P. (org.). Dicionário: rumo à civilização da religação e ao bem viver. Águas Belas: ONG Semente dos Sonhos. No prelo.

WEINREICH, U.; LABOV, W.; HERZOG, M. I. Fundamentos empíricos para uma teoria da mudança linguística. São Paulo: Parábola, 2006.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2237-2083.28.4.1519-1549

Refbacks

  • There are currently no refbacks.
';



Copyright (c) 2020 Anderson Ferreira, Samine de Almeida Benfica

Creative Commons License
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.

e - ISSN 2237-2083 

License

Licensed through  Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional