“A máquina do mundo” em 3D: Drummond, leitor de W.H. Auden / “A máquina do mundo” in 3D: Drummond, reader of W.H. Auden

Cleber Ranieri Ribas de Almeida

Resumo


Resumo: O poema “A Máquina do Mundo” de Carlos Drummond de Andrade é interpretado pela crítica, no que diz respeito ao uso de intertextos, como um poema marcado pelo diálogo subliminar com a Divina Comédia de Dante Alighieri e com Os Lusíadas de Luís de Camões. Em contraposição a esta reiterada interpretação do poema, tentaremos demonstrar a hipótese segundo a qual o cenário de “A Máquina do Mundo” foi construído e imaginado a partir de uma releitura do cenário do poema “As I Walked Out One Evening”, do poeta inglês Wystan Hugh Auden. Drummond fez uma adaptação cenográfica do poema de W.H. Auden. As semelhanças entre os cenários são evidentes no uso dos seguintes expedientes: (a) o cenário de abertura do poema de Auden (no qual um andarilho caminha por uma estrada ou rua e se depara com uma visão maquinal e epifânica) é reutilizado por Drummond; (b) a atmosfera sombria e quase noturna da hora das Vésperas, acompanhada do badalar dos sinos da igreja ou do toque dos relógios, é comum em ambos os poemas; (c) a estrutura dialogal das máquinas que falam e desvelam mistérios é comum aos dois textos; (d) a narrativa escatológica do desfecho dos poemas é, também, muito similar. Concluímos que a semelhança entre os cenários dos dois poemas torna evidente as diferenças entre a perspectiva cristã do poema de W.H. Auden e a perspectiva absurdista do poema de Drummond.
Palavras-Chave: A máquina do mundo; Carlos Drummond de Andrade; W.H. Auden; As I Walked Out One Evening.

Abstract: Critics interpret the poem “A Máquina do Mundo,” by Carlos Drummond de Andrade, in regard to its use of intertextuality, as a poem marked by a subliminal dialogue with Dante Alighieri’s Divine Comedy and with Luís de Camões’s Os Lusíadas. In contrast to this repeated interpretation of the poem, I will try to demonstrate the hypothesis that the scenario of “A Máquina do Mundo” was built and imagined from a re-reading of the scenario of the poem “As I Walked Out One Evening,” by Wystan Hugh Auden. Drummond made a scenographic adaptation of the poem by W. H. Auden. The similarities between the scenarios are evident by use of the following devices: (a) the opening setting of Auden’s poem (in which a wanderer walks along a street and is faced with a mechanical and epiphanic vision) is reused by Drummond; (b) the dark and almost nocturnal atmosphere of Vespers, accompanied by the ringing of church bells or the chiming of clocks, is common to both poems; (c) the dialogical structure of the machines that speak and reveal mysteries is common to both texts; (d) the eschatological narrative at the denouement of the poems is also very similar. I conclude that the similarity between the scenarios of the two poems makes evident the differences between the Christian perspective of W.H. Auden’s poem and the absurdist perspective of Drummond’s poem.
Keywords: A máquina do mundo; Carlos Drummond de Andrade; W.H. Auden; As I Walked Out One Evening.


Palavras-chave


A máquina do mundo; Carlos Drummond de Andrade; W.H. Auden; As I Walked Out One Evening

Texto completo:

PDF

Referências


ANDRADE, C. D. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002.

ARENDT, H. A Vida do Espírito: pensar, querer e julgar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017.

ARENDT, H. A Condição Humana. 11. ed. Tradução: Roberto Raposo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011.

AUDEN, W. H. W. H. Auden: “As I walked out one evening”/”Ao descer a rua Bristol: tradução de Nelson Ascher. In: CICERO, A. Acontecimentos: blog de Antonio Cicero: poesia, arte, filosofia, crítica, literatura, política. [S. l.], 2009. Disponível em: http://antoniocicero.blogspot.com/2009/12/wh-auden-as-i-walked-out-one-evening-ao.html. Acesso em: 26 ago. 2020.

AUDEN, W. H. Collected Poems. Edição: Edward Mendelson. Ney York: The Modern Library, 2007.

AUDEN W. H.; HECHT, Anthony. W. H. Auden’s “In Praise of Limestone”. New England Review (1978-1982), v. 2, n. 1, p. 65-84, Aut. 1979.

AUDEN, W. H. Another Time. New York: Random House, 1940.

AUDEN, W. H. Outro Tempo. Tradução: Margarida Vale de Gato. Lisboa: Relógio D’Água, 2003.

AUDEN, W. H. A Mão do Artista: Ensaios Sobre Teatro, Literatura, Música. São Paulo: Siciliano, 1993.

CAMÕES, L. Os Lusíadas. Porto: Porto Editora, 1997.

CAMPOS, A. Via Linguaviagem. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.

CAMUS, A. Le Mythe de Sisyphe. 69 éd, Paris: Les Éditions Gallimard, 2010. DOI: https://doi.org/10.1522/030174432.

CAMUS, A. O Mito de Sísifo. Rio de Janeiro: Editora Record, 2018.

CAMUS, Albert. O Mito de Sísifo. Tradução: Mauro Gama. Rio de Janeiro, Editora Guanabara, 1989.

DANTE, A. A Divina Comédia. Tradução: Cristiano Martins. 8.ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 2006.

FULLER, J. W. H. Auden: A Commentary. London: Faber and Faber, 2007.

KIERKEGAARD, S. Ou-Ou: Fragmentos de uma Vida. Lisboa: Relógio D’Água, 2017. Primeira Parte.

LEE, F. Arendt & Auden. Amor Mundi, New York, 12 out. 2012. Disponível em: https://hac.bard.edu/amor-mundi/arendt-auden-2012-12-10. Acesso em: 26 ago. 2020.

LIMA, J. Obra Completa. Organização: Alexei Bueno. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1997.

MELLO NÓBREGA. Rima e Poesia. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1965.

O’NEILL, M. Making and faking in some poems by W. H. Auden. Critical Survey, New York, v. 6, n. 3, p. 343-350, 1994.

TIBERGHIEN, G. A. Hodológico. Revista-Valise, Porto Alegre, v.2, n.3, ano 2, p. 161-176, jul. 2012.

VARGIU, L. Walking Throught Landscapes? In: SERRÃO, A. V.; REKER, M. (Ed.). Philosophy of Landscape: Think, Walk, Act. Lisbon: Centre For Philosophy at the University of Lisbon, 2019.

WISNIK, J. M. Maquinação do mundo: Drummond e a mineração. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2358-9787.30.2.6-25

Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Direitos autorais 2021 Cleber Ranieri Ribas de Almeida

Licença Creative Commons
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.

O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira
ISSN 0102-4809 (impressa) / ISSN  2358-9787 (eletrônica)

License

Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.